O mapa-mundi do ferro-velho
Todo ano, 50 milhões de toneladas de lixo eletrônico altamente
tóxico, produzido principalmente na Europa e nos Estados Unidos, têm de
ir para algum lugar. Vão, em boa parte, para a Ásia e a África, onde
rendem dinheiro e problemas de saúde
Na União Europeia, o lixo tecnológico se divide igualmente entre
aparelhos elétricos e aparelhos eletrônicos. Conheça a contribuição de
cada um para a montanha de máquinas descartadas no computador, mesmo
obsoleto, são usados depois em golpes pela internet. “O lixo eletrônico e
um dos problemas de mais rápido crescimento no mundo”, disse a VEJA a
consultora Leslie Byster, da ONG International Campaign for Responsible
Technology (Campanha Internacional pela Tecnologia Responsável).
No mapa, as idas e vindas do chamado e-lixo (em toneladas por ano)
Apesar
de a Convenção de Basileia, na Suíça, em 1989, ter proibido o movimento
entre fronteiras de resíduos perigosos (entre os quais as sobras
eletrônicas), a legislação e notoriamente driblada pelos exportadores de
traquitanas com chip, que etiquetam a carga como doação de equipamentos
usados. O relatório ambiental de 2010 da ONU sobre lixo tecnológico
calcula que são produzidos anualmente 50 milhões de toneladas. O
relatório também prevê que o volume de dejetos procedentes de
computadores abandonados crescera 500% em países como Índia, China e
África do Sul ate 2020. O Brasil, o México e o Senegal são, entre as
nações em desenvolvimento, os campeões mundiais de e-lixo per capita,
com 0,5 quilo anual produzido por habitante.
O quadro brasileiro
pode ser ainda mais grave. Segundo a professora Wanda Gunther, da
Faculdade de Saúde Publica da USP, faltam dados e estudos nacionais
amplos sobre o problema. mas o crescimento econômico fará aumentar a
podridão eletrônica, em um caminho natural — e saudável, ate que
provoque sujeira — do capitalismo. As pessoas tendem a trocar seus
produtos, passando a frente os já velhos e ultrapassados. Querem o novo,
e o destino final do que já não presta, ou não tem interessados na
cadeia econômica, e o descarte. Simples assim. O nome do jogo, nesse
caminho, e obsolescência programada, recurso de administração
desenvolvido nos anos 20 pelo americano Alfred Sloan, então presidente
da General Motors. Sloan criou um mecanismo, hoje tão natural que parece
ter existido desde tempos imemoriais, de modo a atrair os consumidores a
trocar de carro frequentemente, tendo como apelo a mudança anual de
modelos e acessórios. Bill Gates, fundador da Microsoft, usou a
estratégia nas atualizações do Windows, o onipresente programa de
computador. Mais recentemente, a obsolescência programada virou regra
nos produtos da Apple. O iPad foi lançado em janeiro de 2010. em marco
de 2011, surgiu o iPad 2. Ha rumores de que já em fevereiro de 2012 seja
anunciada a versão 3. Não tardará que cheguem aos lixões do Paquistão e
também aos da África, rejeitados. No início dos anos 90, a vida media
de equipamentos eletrônicos nos estados Unidos era de quatro anos, num
casamento entre a qualidade do material usado para o hardware e a
espantosa velocidade de desenvolvimento dos softwares.
Hoje, a
vida media é de um ano e meio. Segundo Neil maycroft, professor da
Lincoln School of Art & design, da Inglaterra, a curta existência
dos aparelhos e resultado de dois fatores. “de um lado, os produtos são
feitos para durar pouco. De outro, ha a obsolescência estilística”, diz.
“Somos regidos pela cultura de trocar a cada ano de modelo — de
computador, de tablita, de celular — quando o antigo ainda funcionava
muito bem”, diz maycroft. Trata-se de uma das características mais
evidentes de nosso tempo, o efêmero a impor hábitos. Não e postura
necessariamente danosa, e sim produto da agilidade da tecnologia
ancorada nos espetaculares avanços dos microprocessadores associados a
internet. Segundo o instituto de pesquisa Gartner, 364 milhões de PCs e
468 milhões de celulares e smartphones serão vendidos globalmente ate o
fim deste ano. E um mar de equipamentos que presumivelmente engrossara
as estatísticas do lixo tecnológico ate 2014. O nó eletrônico parece um
nó górdio — impossível de desatar. “E necessária uma legislação
internacional mais rigorosa sobre o problema”, diz Leslie byster.
Porém,
como salienta o especialista em sustentabilidade britânico James Clark,
da Universidade de York, não haverá solução sem a conscientização das
vantagens econômicas envolvidas na reciclagem do lixo eletrônico. “o
Japão, graças a um programa benfeito de reaproveitamento de
equipamentos, hoje acumula três vezes mais ouro, prata e o metal índio
(usado na fabricação de telas de cristal líquido e painéis solares) do
que o mundo usa anualmente”, diz Clark. Iniciativas como a japonesa, na
contramão da deposição pura e simples, numa selva de malversações e
contrabando, alimentam um negócio interessante, e de futuro, desde que
organizado e com regras claras. O mercado de reciclagem do lixo
eletrônico crescerá dos 5,7 bilhões de dólares atuais para 15 bilhões de
dólares até 2014. Há solução para o drama do lixo eletrônico, e ela é
limpa.
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